segunda-feira, 16 de julho de 2012

Geraldina


Sonhei que tinha uma filha de cinco anos. Ela começava a rir sozinha na sala de estar e dizia: a vovó ta fazendo cosquinha!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Perdoar


16/12/2011 (o texto é antigo, mas eu só tive coragem de postar agora...)

Ontem ao acordar, corri para conferir o ranking da PUC, que havia sido postado de madrugada. Liguei o computador, pluguei os cabos na internet, abri o navegador, digitei o link do site, minha senha e meu número de inscrição. De dedos cruzados, vi uma página com meus dados surgir na tela. Descendo mais um pouco a barra de rolamento, espanto: minha nota vinha ao lado da frase: Primeiro Lugar. Nunca duas palavrinhas ficaram tão bem juntas.
Não consegui conter a alegria. Como assim primeiro lugar? Como não havia ninguém melhor do que eu fazendo a prova? Eu consegui uma bolsa integral na melhor e mais cara faculdade particular do Rio de Janeiro??!! EU CONSEGUI UMA BOLSA INTEGRAL NA MELHOR E MAIS CARA FACULDADE PARTICULAR DO RIO DE JANEIRO!!!
Primeiro impulso (tenho que me acostumar com a palavra “primeiro” na minha vida): Contar para a minha mãe.
Sonho: minha mãe está de pé, colocando a mesa do café da manhã. Ela olha para mim e logo percebe o que me trouxe ali. “Eu sabia que você conseguiria!!”, ela diz, enquanto me dá um abraço apertado. Talvez atraídos pelo cheiro de pão fresquinho, talvez por pressentirem a boa notícia no ar, minha avó e meu irmão juntam-se a nós e todos comemoramos.
Realidade: Chego na sala e minha mãe está deitada no sofá, com cara de dor. Ela mal consegue respirar com sua máquina de oxigênio devido aos tumores que comprimem seus órgãos. Uma tristeza enorme toma conta de mim. Mas no coração onde cabe dor, cabe também alegria. “Não posso menosprezar a minha conquista!” – penso.
-Mãe, adivinha quem tirou 1º lugar para geografia na PUC...– dou um tempo para ela computar a informação... – EU!!!
Ela leva alguns segundos para absorver o que acabara de ouvir, depois abre um sorrisão e seus olhos se enchem de lágrimas. As lágrimas descem em cascata. A cascata vem seguida de um soluço engasgadode quem quase não respira. Ela estava engasgada de verdade!
Minha avó veio correndo. “O QUE HOUVE, MEU DEUS?! O QUE VOCÊ FEZ COM A SUA MÃE?!”
-Nada, vó, eu só avisei que EU TIREI 1º LUGAR NA PUC!– olhei para ela, esperando os parabéns. Mas ao invés de um abraço apertado e congratulações, eu recebi uma baita bronca:
                -Como é que você avisa uma coisa dessas para a sua mãe? Não sabe que ela não pode ter emoções fortes? Olha só como ela está agora! – nós duas a olhamos. Estava vermelha de choro e falta de ar – Calma, minha filha, não se desespere! – e, olhando para mim - Faça alguma coisa! Vá buscar um copo d’água!
                Não era exatamente essa reação que eu esperava...

É certo que eu me sinta feliz pelo meu resultado mesmo com a minha mãe doente? Eu sou insensível? Ah... Não posso chorar o tempo todo. Alguma alegria eu preciso ter! É justo SIM que eu comemore a minha conquista! Afinal, ela reflete uma vida escolar inteira de dedicação e comprometimento. Agora eu não posso querer compartilhar essa boa notícia com a minha mãe, pessoa que sempre me ajudou e apoiou? Negativo. O mérito é dela também.

Minha avó me olhou como quem diz: “você vai ficar aí parada?”

Foi a vez das lágrimas brotarem dos meus olhos e escorrerem pelo meu rosto. Mas se nem a felicidade eu posso compartilhar, quanto mais a tristeza. Achei melhor sair do cômodo antes que percebessem. Fui ao banheiro, liguei o chuveiro e deixei as lágrimas se misturarem ao jato d’água quente.
O banho me animou um pouco, mas não o suficiente para eu esquecer a mágoa do meu coração. Passei a tarde para baixo. Que merda de avó é essa que nem sabe parabenizar a neta? E pior: do que adianta um 1º lugar se eu sou impotente diante do que está acontecendo com a minha mãe?Eu superestimo todo mundo. Minha avó não é a Dona Benta, e sim uma velha insensível e paranoica. E eu sou só uma garota que se acha demais por ter feito vestibular com pessoas mais burras que ela.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.
Minha mãe está doente e eu quis roubar a atenção para mim. Eu tenho nojo de mim.

Depois do banho, ainda me sentindo culpada, fui para o meu quarto, me deitei e esperei o sono vir, mas o aparelho de oxigênio da minha mãe soava como um helicóptero na sala, espantando qualquer perspectiva de soneca.
Eu tirei 1º lugar na faculdade e não tenho ninguém para comemorar comigo. Estou sozinha no mundo.
De repente, ouço a voz embargada da minha mãe me chamar. Vou até a sala. Recuperada do susto, ela me recebe de braços abertos e diz “estou muito orgulhosa de você”. Foi tão maravilhoso ouvir aquilo que toda a culpa foi embora e eu chorei lágrimas de felicidade, as primeiras em muito tempo. Mamãe me fez ligar para o meu pai, contar a notícia e ainda marcar um jantar de comemoração, ao qual ela não poderia estar presente fisicamente, mas prometeu estar de coração e pensamento.
                Ao jantar foram meu pai, meu irmão, meus padrinhos e a filha deles, uma grande amiga. Minha avó não quis ir, mas essa altura eu nem ligava mais. Comemos e brindamos pela felicidade e saúde, as únicas coisas que importam de verdade. Voltei para casa leve e realizada.

Na manhã seguinte, ouvi minha avó contar, ao telefone, que estava orgulhosa de mim por eu ter ido bem no vestibular. Quem diria! E eu que achei que ela não estava nem aí! Depois de terminar a conversa ela desligou o telefone e passou por mim, sem me olhar nem dizer uma palavra. Não guardei rancor por isso. Foi suficiente saber que ela tinha prestado atenção à notícia do primeiro lugar e que estava feliz por mim.
Nem sempre as pessoas conseguem manifestar seus sentimentos, o que não quer dizer que elas não os sintam. Minha avó é desse tipo, não parabeniza nem deixar transparecer que está orgulhosa, mas no fundo eu sei que ela está,e isso me basta. Estou tranquila.
Mamãe sempre se queixa de nunca ter recebido carinho nem ouvido um “eu te amo” da mãe dela. Eu não sei o que é isso, tenho a mãe mais carinhosa do mundo. Deve ser mesmo muito ruim não ter um colo, um beijo, um abraço para acalentar. Mas, ao mesmo tempo, entendo que a vovó tenha repetido para os filhos a criação que recebeu dos pais (uma dona de casa e um coronel da marinha, ambos filhos de imigrantes portugueses), que também não diziam “eu te amo”, embora amassem. Por isso ela não dá carinho em forma de colo, beijo ou abraço, e sim garantindo que nada material falte em casa.
O amor está nas compras do supermercado, nas horas de sono perdidas, no jeito hipocondríaco de ser, na preocupação com o casaco, o horário, a alimentação. Não fosse seu amor, ela não teria se mudado aqui para casa paradedicar-se a filha. Ela pode estar longe de ser a avó mais carinhosa do mundo, mas isso não significa que ela não ame a gente. Eu sei que ela ama. Eu a amo também.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Estrela (parte 1)


Ânima

Essa noite, sonhei que conversávamos sobre música e você me dizia que adorava a canção “Estrela do Mar”, da Dalva de Oliveira. Dentro do sonho, eu me lembrava da minha mãe cantando essa mesma música numa peça de teatro chamada “Todas as noites de todos os dias”. Então eu abri os braços para mostrar como ela fazia e, de repente, o quarto onde estávamos se transformava em um enorme palco. E, quando me dei conta, já não era eu quem estava em mim: eu era uma nuvem etérea pairando no ar, enquanto meu corpo, no centro do anfiteatro, era animado por outra alma.
Tive medo. Quem me deixou sair?
Meu primeiro impulso ao perceber que estava fora de mim foi tentar recuperar meu corpo. Mas aí a voz que me habitava começou a cantar...
“Um pequenino grão de areia,
Que era um pobre sonhador,
Olhou para o céu viu uma estrela,
Imaginou coisas de amor (...)”
Só então reconheci aquela voz doce, tão familiar. Era minha mãe quem, sob um enorme holofote, cantava em meu corpo, enquanto minha alma a observava, livre da matéria, onipresente. A saudade de ouvir sua voz foi maior do que o medo e a deixei manifestar-se em mim.
“Passaram anos, muitos anos,
Ela no céu ele no mar,
Dizem que nunca o pobrezinho
Pôde com ela encontrar(...)”
Minha mãe sorriu em mim e, de braços abertos como se quisesse abarcar o mundo, voltou a cantar:
“Se houve ou se não houve
Alguma coisa entre eles dois
Ninguém soube até hoje explicar
O que é de verdade é que depois, muito depois,
Apareceu uma estrela no mar”
Ao término da música, como uma névoa perolada, minha mãe saiu de mim, e eu experimentei a estranha sensação de voltar ao corpo. O palco se desfez e eu acordei num sobressalto. Eu suava frio, embora sentisse meu corpo queimar por dentro, e não tinha certeza de estar totalmente de volta a mim.
“Vivi uma experiência extracorpórea! Como isso pôde acontecer?”
Muito assustada e com muito medo de sair de mim de novo e não conseguir mais voltar, permaneci deitada, de olhos bem abertos por minutos que me pareceram a eternidade. Aos poucos fui me acalmando e interpretei aquilo tudo como uma tentativa da minha mãe de me mandar alguma mensagem.
“Morte é transcendência”, eu pensei, “é libertar-se da matéria”. Se cantar, atuar e sentir estão condicionados à forma física, usar o meu corpo foi a maneira que minha mãe encontrou de retornar ao mundo sensível para me ensinar alguma coisa (que só poderia ser dita através da matéria). Mas o que seria?
Tentei raciocinar por um tempo, mas logo fui vencida pelo cansaço e adormeci. Só acordei de manhã, já atrasada para a faculdade. Passei o dia todo com o sonho na cabeça, mas quanto mais tentava entender seu sentido, menos compreendia aquilo tudo. Tentei me convencer de que tinha sido só uma fantasia maluca, mas não acreditei em mim mesma. Só de tarde, quando fui dar uma volta para espairecer, as respostas vieram.
Zanzando de bicicleta a mil por hora, ouvi uma voz me chamar. Freei a bike e vi Eveline, grande amiga e professora de canto da minha mãe.
-Pensei muito em você ontem à noite! – ela disse- Gostaria tanto que você fizesse uma aula de canto comigo, sem compromisso, seria tão bom te ouvir cantar pelo menos uma vez... Sua mãe sempre disse que você tinha uma voz linda... Significaria muito para mim, e sei que para ela também.
E tem gente que acredita em coincidências! Marcamos a aula para o dia seguinte e, adivinhem que música eu escolhi para cantar? “Estrela do Mar”, da Dalva de Oliveira. Eveline, sentada no mesmo piano, tocou as mesmas notas enquanto eu cantava na mesma sala que, anos antes, minha mãe ensaiara aquela mesma canção. Todas as noites de todos os dias...

terça-feira, 17 de abril de 2012

O eterno retorno

Lembro-me do dia em que percebi que meus filhos não teriam avó. Minha mãe ainda não havia morrido, mas sabíamos que era uma questão de tempo.
         Cheguei ao psicólogo forjando um semblante calmo e sustentando uma força que eu não tinha. Eu chorava por dentro. Sabe aquele choro de quem busca a cumplicidade e o acalanto materno, mas (por quê?) não encontra ninguém apara abraçar?
- Minha mãe seria uma avó tão maravilhosa! A melhor de todas: alegre, divertida, amiga. Não é justo que eles não tenham a oportunidade de conhecê-la. – disse; minha fortaleza ruindo como um castelo de cartas.
Sônia pensou um instante e depois me perguntou se eu sentia falta do meu avô, referindo-se ao pai da minha mãe, que morrera seis anos antes de eu nascer.
-Falta não é a palavra certa porque eu nunca o conheci. Eu sinto curiosidade de saber como ele era.
-E como você acha que ele era?
-Minha mãe sempre o descrevia como inteligente, espontâneo e divertido. Ele era um apreciador das artes, adorava cantar e dançar. Estava sempre falando besteira. Era autodidata em italiano e francês, fez faculdade de arquitetura, jornalismo e letras. Estava sempre lendo um livro...
Sônia me ouviu atentamente e pousou o olhar sobre o livro que eu trazia comigo: Demian, de Hermann Hesse; depois observou minha roupa: uma calça legging de quem acabara de voltar da aula de dança. Abriu um sorriso e disse:
-Olhe quantas dessas características estão presentes em você!
Ela deixou que eu maturasse o que acabara de ouvir e, depois de alguns segundos, continuou:
-Há coisas que a ciência não explica, aliás, a maioria das coisas. Eu acredito que há um DNA emocional, que é o responsável por termos a personalidade ou características psicológicas iguais a de parentes que nem chegamos a conhecer. No fundo, nada se perde.
Olhei para o livro ao meu lado e ri como se tudo fizesse sentido.
-Sabia que Hermann Hesse era o escritor favorito do meu avô?
E ela sorriu como se já soubesse.
-De todos os autores que li, Hesse também é o meu favorito. A capa de “Demian” – um pássaro saindo de um rosto de medusa - se insinuou para mim em um velho sebo e decidi levar. Assim, por acaso. Outro dia minha avó o viu sobre minha cama e contou que meu avô o carregava para cima e para baixo, feito bíblia, assim como eu faço hoje.

Foi nesse momento que eu compreendi a grande oportunidade que meus futuros filhos teriam: a de eternizar minha mãe dentro deles, de vivê-la em seu âmago e difundir sua essência sobre a Terra. Eu vi o mais velho (minha mãe já disse que será um menino) lendo Gabriel Garcia Marques sem saber que  seu tio se chama Gabriel em homenagem ao autor, que era o favorito da sua avó. Depois vislumbrei a filha mulher que eu talvez tenha fazendo aulas de teatro, cantando no chuveiro e estampando no rosto aquele sorrisão lindo de quem saboreia a vida com gosto.
Eternizar minha mãe em mim virou também o meu exercício diário: viajei para um mosteiro budista, pesquisei sobre astrologia e filosofia oriental, voltei às aulas de teatro e dança e me aproximei do irmão, Gabriel. 
Hoje, quatro meses depois do dia que mudou tudo, abro as primeiras páginas de Sidarta, também do Hesse. O livro cheira a novo, mas me transporta para fora dos três tempos. Estou junto ao meu avô, que amava minha mãe e Hesse; junto à minha mãe, que amava meu avô e o budismo e junto a mim mesma, como há tempos não me sentia. 
O ciclo se renova. Nada se perde.



terça-feira, 13 de março de 2012

MAIS DE 2000 VISUALIZAÇÕES!

Eu não pude aparecer por aqui esse mês, mas pelo visto fui a única. As visualizações do blog cresceram em PG (por que eu ainda uso esses termos?? Estou na faculdade! Termos técnicos de matemática nunca mais!!), e isso é maravilhoso! A última vez que entrei no blog, o número de visualizações estava em torno de 1700, hoje elas atingiram a marca de 2096, e por isso eu estou muito, mas muito feliz! Caguei se Rebecca Black tem exatas vinte cinco milhões, setecentos e oitenta e sete mil, seiscentas e quinze visualizações no vídeo da sua música Friday. Estou mais que satisfeita com minhas singelas duas mil.
Desde que os primeiros textos foram postados, recebi muitas palavras de apoio, fiz novos e bons amigos e me surpreendi com pessoas que nunca imaginei lendo o blog e que, no entanto, não só leram como comentaram e compartilharam. Vários leitores me adicionaram no facebook e é muito incrível perceber que, embora eles sejam estranhos para mim, eu não sou mais uma estranha para eles. Todos vocês me conhecem como ninguém.
Ah! E as visitas ao blog não param só no Brasil! Tem gente do Reino Unido, da Espanha, Itália, Portugal, Costa Rica e até Hong Kong! É claro que é muito mais provável que sejam visualizações de amigos de amigos meus que estavam passando as férias nesses lugares, mas eu prefiro de pensar que há um chinesinho de olhos puxados que está aprendendo português só para poder ler os posts. Ah, e que há um costarriquenho muito gato dançarino de rumba, heterossexual, desimpedido e que adora ler o blog.
Se quiser me fazer uma visita, pode vir que eu te hospedo na minha casa, viu?

Escrever textos para esse blog tem se revelado um hobbie muito terapêutico, bem mais divertido do que escrever um livro, por exemplo. Um blog não é, ele está sempre sendo. Todos vocês me ajudam a construí-lo a cada dia, a cada mensagem, a cada compartilhamento. Os comentários completam os textos e juntos eles formam uma única mensagem, às vezes de alegria, às vezes de tristeza, mas sempre de esperança.

Obrigada!

VOLTEI!!!!

Depois de 1 mês e 9 dias sem postar, voltei a dar as caras por aqui. Muita coisa aconteceu nesses 38 dias: eu me mudei para uma nova casa com meu irmão e meu pai, viajei nas férias, curti o carnaval no Rio, comecei a cursar duas faculdades, fui abduzida por alienígenas que estudam matemática, virei colaboradora no roteiro de um filme, fui chamada para ser standing numa peça de teatro... Tantas coisas que eu poderia passar um tempão listando.
Durante esse período de mudança (não só espacial, mas mudança de todo um ciclo de vida), estive sem internet, computador, telefone, televisão... Até o meu celular escangalhou. Minha desconexão total me impediu de postar novos textos, mas agora que meu tour pelo paleolítico já acabou e eu voltei ao século XXI, me comprometo escrever sempre que a inspiração vier. Sem mais delongas, vamos aos posts...

sábado, 4 de fevereiro de 2012

As Helenas da vida

Mostrei uma foto da minha mãe a minha fisioterapeuta e ela disse, sem pensar duas vezes: “Nossa, como a sua mãe era linda! Você deve ter puxado seu pai”. Eu comecei a rir, e ela, ao perceber a gafe que cometera, logo tratou de se retratar: “Quero dizer, puxou o tom de pele dele e a cor dos olhos!”.
Não, eu não puxei os olhos azuis da minha mãe, nem a pele clara, nem os cabelos louros. Mas sabe de uma coisa? Isso nem de longe é um problema. Eu herdei coisas muito, mas muito mais importantes do que tudo isso: o senso de humor, a capacidade de se reerguer mesmo quando a vida dá aquela rasteira na gente, a compaixão pelos outros, a determinação para alcançar meus objetivos entre tantas outras qualidades notáveis da minha mãe.
Não, eu não tenho perfil de mocinha indefesa. Uma agulhada no dedo nunca me faria dormir por 100 anos, uma maçã envenenada não me derrubaria e eu não sou do tipo que fica esperando o príncipe encantado me beijar para acabar com meu feitiço. Minha mãe me ensinou a correr atrás dos meus interesses, porque só a gente sabe dar a devida atenção a eles.
Algumas pessoas nascem Hérmias de “Sonho de uma Noite de Verão”, aquela pela qual todos os mocinhos se apaixonam. E outras nascem Helenas, a personagem atrapalhada que sempre se interessa pelo cara errado. Não quero namorar um Ken da Barbie, cheio de gel no cabelo, roupas de couro e o carro do ano.
No teatro da vida, sinto um prazer enorme em interpretar a melhor amiga estabanada da protagonista, aquela que sempre se mete nas maiores roubadas e ri de si mesma junto com a plateia, porque sei que todos os papeis são igualmente importantes, sejam eles protagonistas, coadjuvantes, figurantes, diretores ou contrarregras. Cada um contribui à sua maneira para que o resultado final valha a pena ser vivido.


Minha pipa lá no céu

Dezembro de 2011 foi o caos: mãe terminalmente doente, provas escolares, vestibulares, enfermeiros em casa, vovó materna que decidiu acampar no meu quarto. O cenário não era nos melhores. É impossível se concentrar nos estudos sabendo que, no quarto ao lado, sua mãe chora de dor. É impossível se concentrar na sua mãe que chora de dor sabendo que, no quarto ao lado, milhares de folhas de cadernos precisam ser lidas e memorizadas para ontem.
Eu estava lá, com o corpo tentando me manter em pé numa casa movediça e a mente vagando bem longe dali. Longe do sofrimento da minha mãe, da eletrólise de química e das múltiplas escolhas. Na minha cabeça eu sonhava com um cantinho só meu. Nada muito grande, eu queria um espaço que coubesse eu e mais ninguém.
Sonhar era tudo que eu podia fazer para esquecer o caos. Eu era como aquele menino que contempla a sua pipa lá longe no céu e, nesse momento, esquece que está descalço no chão imundo, esquece do frio, da fome, da solidão e da dor. Só existiam a pipa e ele, eu e meus sonhos.
Quantas vezes eu me culpei por não me dedicar 100% ao colégio, ao vestibular e, principalmente, à minha mãe! Mas hoje eu vejo que foram justamente esses devaneios que me impediram de afundar na areia movediça sob meus pés.
Agora que a minha vida entrou nos eixos de novo, não sonho mais com um canto só meu. Sonho com a casa ampla para a qual me mudarei com meu irmão e meu pai. Nessa casa cabe a minha avó (e eu juro que nem vou mais me importar se ela acampar no meu quarto), cabem todos os meus amigos e cabe a minha mãe também, que continua presente nos móveis que ela comprou, nas roupas que ela escolheu, nos quadros que ela emoldurou e nas lembranças que cultivamos com amor.
Essa pipa que eu empino hoje é muito mais importante do que aquela de quando eu sonhava com um quartinho só pra mim, porque ela voa, mas eu sei que a hora de puxá-la e trazê-la de volta para mim não tardará a chegar. 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Mamãe virou pirlimpimpim

Eu e minha mamãe linda na peça Shakuntalá, 1997


Uma vez eu perguntei a minha mãe porque ela não ia ao cemitério visitar seu pai, que morreu quando ela tinha apenas 21 anos. Ela me respondeu que era porque o pai dela não estava lá: lá só havia uma caixa de ossos debaixo da terra. Por isso, quando ela queria homenagear o pai, fazia o que ele mais gostava: ia ao teatro, ao cinema, dançava, lia, ouvia música. Mas eu era muito pequena para entender o significado disso tudo.
Hoje eu a compreendo como nunca. Minha mãe não está lá, naquele bauzinho de cinzas porque ela não cabe num bauzinho de cinzas. Não cabe nessa sala, nesse quarto, muito menos naquele caixão. Minha mãe não é matéria, é um amor enorme que eu nutro em mim, é algo muito grande para ser confinado numa caixa de madeira.
Por isso, quando eu também quero me lembrar dela, eu faço tudo que ela gosta. Há muito mais da minha mãe naqueles atores desconhecidos da peça que eu vi ontem, naquele banho de cachoeira e naquela música que eu tanto ouço do que num pozinho acinzentado com seu DNA. Não vou carregar para cima e para baixo um saquinho de cinzas. Minha mãe é vermelha, laranja, azul, verde, não cinza. Ô corzinha mais chocha esse cinza.

A percepção da morte eminente é um tremendo exercício de desapego. E põe “tremendo” nisso, põe choro, põe desespero, põe indignação. Minha mãe passou por tudo isso e morreu tranquila, consciente de que viveu o que tinha para viver, e o melhor, viveu bem. Por isso hoje eu dou continuidade a esse desafio diário de me desapegar. O que eu preciso dela está em mim, e ninguém pode tirar para usar como suvenir.
Sexta feira eu farei uma bela homenagem a ela: um lindo passeio de barco com seus familiares e amigos. Sairemos do Marina da Glória rumo as Ilhas Cagarras, onde daremos um mergulho refrescante e lançaremos suas cinzas ao mar, feito pirlinpimpim. As cinzas cinzentas vão ficar azul da cor do mar. Azul da liberdade e da paz, do jeito que a minha mãe gosta.

Eu também decidi doar seus figurinos de teatro. Não para me livrar deles, como pensam os apegados, mas sim porque não vejo razão em mantê-los mofando no guarda-roupa. Tenho certeza que a minha mãe preferiria mil vezes de vê-los no corpo de outras atrizes, no palco. Aquela peruca loura dos tempos de quimio também irá parar na cabeça de muitas. E que façam bom uso! E que fiquem lindas como a minha mãe ficou ao usá-las (não tão lindas, porque isso será impossível).
Quem sabe um dia eu não assisto a uma peça na qual a atriz use a tal peruca? Será mera coincidência? Para os incrédulos apegados sim, mas não para Isadora Libório. Minha mãe estará ali -junto com meu avô- na plateia, no palco, nos atores e naquela filha emocionada no assento I-17. Raquel estará em todos os lugares, mesmo que em lugar nenhum, pois ela é um estado de espírito, e quando a tristeza passar e virar só saudade, eu vou subir num palco e dizer: “Hoje eu estou tão Raquel!!”.


Como dar a notícia sem matar o coleguinha de susto

Há alguns dias atrás, encontrei em uma festa um colega de infância. Fizemos aula de teatro juntos com a minha mãe, quando ela dava aulas extracurriculares na nossa escola. Tínhamos, na época, 7/8 anos. Desde então, sempre que nos vemos, ele pergunta com muito carinho como vão meus pais. Dessa vez, a pergunta foi a mesma, mas a resposta... Ah, essa foi beeeeem diferente. Eu conto:

- E aí, como vão seus pais?
Fudeu.
- Éeeee... Meu pai vai bem... Aaaaa... A minha mãe...

O que eu respondo????
a)      Fugiu para as Bahamas com um dançarino de rumba e nunca mais vai voltar.
(Péssima ideia. Ele vai pensar que ela é uma maluca que abandonou os filhos)
b)      Ela bateu as botas.
(E corro o risco de estragar a noite dele e ainda fazê-lo entrar numa bad trip total).
c)       Ela nunca esteve melhor.
(E dou a ele o benefício da dúvida)

Fiquei com a última opção. Não é uma mentira, é? Certo, também não é uma verdade, mas pelo menos eu não teria que passar por nenhuma situação embaraçosa.
- Minha mãe nunca esteve melhor
- Jura? Que bom! O que ela tem feito? Alguma peça de teatro?

Gelo. O que eu respondo (de novo)????
               
- Bem, na verdade ela morreu.
                - Como assim, morreu?
                - Tipo, bateu as botas, sabe? Pá pum. Morreu morrido. Câncer. – Meu Deus, o que eu estou dizendo?? Ele está ficando vermelho! Ele começou a tremer! Olha o que você fez, Isadora! Menina má, má, má!
                - Ai, não! Desculpa! Você está bem? Quer um copo d’água? Gente! Alguém, por favor, trás um copo d’água! Não vodka, Luisa, água! Tá, vodka serve. Bebe isso aqui.
                - Desculpa! Desculpa! Desculpa! Eu pensei que... Sempre a via tão bem... Como que?... Não imaginei que...

Legal, agora ele está super culpado por ter perguntado e eu estou super culpada por ter dito a verdade sem preparar o terreno antes. Mas como preparar o terreno no meio de uma festa? Aliás, como preparar o terreno em qualquer lugar? Dar a notícia é sempre tão... horrível!


Dica do dia:
Sabe aquela piada do gato subiu no telhado? Tá, você não sabe. Nem eu vou contar, sou uma negação para contar piadas (e olha que meu pai é palhaço). A moral da piada (sim, é uma piada com moral! Já deu pra ver que não é de loura nem de português, né?) é que não devemos dar a notícia toda de uma vez pra não matar o coleguinha de infarto (como eu quase fiz). Devemos comer pelas beiradas.
                Jeito errado:
                -Ae, sacoé essas parada ae da vida, pacero. Tá mortão.
                -Xiiiii, ela já morreu faz tempo! Não te avisaram?– a pessoa que estiver recebendo a notícia dessa maneira vai se sentir um zé-ninguém-sem-importância que nem foi avisado do falecimento.
                -Como assim você não foi ao enterro? Nem ligou para a família? – ele vai se sentir culpado por não ter ido à cerimônia nem ter dado apoio aos familiares. Não é culpa dele se não o avisaram a tempo. Para vocês terem ideia, amanhã faz um mês que a minha mãe morreu e ainda tem gente que liga dizendo: “Acabei de saber! Como foi isso? Ela estava doente??”.
                 -Ele (a) está comendo capim pela raíz – ô sem noção! - Como alguém pode falar uma coisa dessas?
                -Ele (a) passou dessa para melhor – chega de eufemismos, por favor. Na era do afrodescendente e do homoafetivo não se pode mais dizer “morreu”?
Não precisa parecer desesperado. Se você for acabar em lágrimas toda vez que der a notícia, os 70% de água do seu corpo vão virar 5. Mas também não seja frio. Opte pelo caminho do meio, como diria Sidarta Gautama.
Não dê a notícia rindo. Ou a pessoa vai achar que é piada ou ela vai te achar um sem noção. E nenhuma dessas alternativas é legal.
Ah! E o mais importante! Se não quiser matar o ouvinte de susto, só diga que a pessoa morreu SE TIVER CERTEZA!

Jeito certo:       
Peça para a pessoa se sentar, se achar necessário.
Tenha em mãos um lencinho, um ombro amigo ou, no meu caso, um copo de vodka.
Esteja (pelo menos pareça) confiante de que vai dar tudo certo. Sabendo que você está bem, ou outros não se sentem tão mal.
Diga que depois que a tristeza vai embora, ficam a saudade e as lembranças boas. E isso é uma verdade incondicional.
Abrace!
                 

               

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

First cut

Ninguém quer morrer, é definitivo demais. Mas também ficar e ver a pessoa que você mais ama partir não parece uma boa opção. Não seria muito mais fácil para quem vai e para quem fica se nós não criássemos vínculos? Se não nos apegássemos às pessoas, objetos, lugares e vivêssemos e morrêssemos sem olhar para trás?

Às vezes eu me perguntava quem é que sofre mais: a mãe que morreu ou os filhos, os pais e marido que continuam vivos. A cada nova conclusão, eu desviava minha piedade a uma pessoa diferente. E, enquanto todos diziam “coitada da Isadora, ela acaba de perder a mãe”, eu pensava: coitado do porteiro, da minha avó, da empregada doméstica, do amigo da fulana. E era assim que eu me esquecia da minha própria dor, ajudando quem parecia pior do que eu.

Esse fim de semana eu viajei com uma grande amiga que também perdeu a mãe recentemente. Há muito de mim nela, e muito dela em mim: mesma paixão pela escrita, mesmo interesse por cinema, mesma vontade de mudar o mundo. Eu me vi nela, como a um espelho, e acho que ela também se viu em mim, nem que seja no fio de cabelo cacheado que eu também tenho.

Domingo tarde seu pai nos levou a uma cachoeira.  No carro ouvíamos “first cut”, de Cat Stevens. Num dado momento, ela desceu para abrir o portão da fazenda e voltou bem no refrão: “baby I'll try to love again”, que seu pai cantava a toda altura. Ele abriu o maior sorrisão quando ela entrou de novo no carro. Aquilo era felicidade plena. Sabe aquele sorriso de pai orgulhoso? Ele já não precisava tentar amar de novo. Tudo que ele mais amava no mundo estava bem ali na sua frente: aquela menina linda, inteligente e determinada que ele mesmo fez.

Foi um daqueles momentos mágicos em que a música que a gente está ouvindo se encaixa perfeitamente, como uma espécie de narração. Lágrimas envergonhadas desceram pelo meu rosto. Era ela ou era eu? Era meu pai quem dirigia?  Estou vendo um filme sobre a minha vida?

E foi então que eu entendi que não existe essa história de “quem sofre mais”. Todo mundo sofre, cada do seu jeito. Ninguém vai substituir o vazio de quem perdeu a mãe, a irmã, a filha ou a mulher. E que bom que é assim. Que bom que não há uma Isadora Genérica que se compra na farmácia para me substituir quando eu morrer. Somos todos autênticos à nossa maneira.

E quer saber? Ainda bem que as pessoas criam laços, têm filhos e formam famílias. Já pensou que insignificante seria a nossa existência se não estabelecêssemos vínculo nenhum? O único jeito da gente se fazer presente depois de partir é na lembrança quem amamos. E é por isso que, em meio a esse caos que é vida, um pai poderá sempre olhar para a filha e ver nela tudo que ele precisa.

Naquela noite, voltei para casa e meu pai me recebeu com um sorrisão orgulhoso no rosto.

Poia 0800

- Vídeo Nacional, Pâmela, boa tarde.
- Boa tarde, Pâmela. Estou ligando para cancelar a conta de Raquel Libório, 768.
- Pois nâum, senhôra Raquel.
- Não, eu não sou a Raquel. Sou a filha dela. Raquel faleceu.
- Lamêinto senhora, mas o cancelamêinto só pode ser feito pelo titular da conta.
- Isso não será mais possível. Ela faleceu.
- Só ela pode estar fazêindo o cancelamêinto.
- Você não está entendendo. Ela não pode “estar fazendo” nada! Ela MORREU!
- Lamêinto senhora. – paf, Pâmela desligou na minha cara.

Onde já se viu? Agora antes de morrer a pessoa tem que se preocupar em cancelar a conta da locadora, o cartão fidelidade no Fellini e o cadastro Cliente-Droga-Raia? Só me faltava essa!

Bem feito, Pâmela, sua poia. Aluguei 3 filmes em nome da minha mãe e NÃO PRETENDO DEVOLVÊ-LOS. Quero só ver para onde ela vai estar mandândo a cobrança.

Algumas coisas na vida, se não fossem cômicas seriam muito, muito trágicas!

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Minha prima de seis anos veio me perguntar se era verdade que a minha mãe tinha morrido. Assim, sem nenhum rodeio, nenhum medo de me ofender. Para ela, a morte é só uma palavra qualquer, como pirulito, montanha, nuvem.
- Sim. No Natal, o Papai Noel passou e levou minha mamãe de presente no trenó. Ele estava cansado de dar presente pra todo mundo e nunca receber nenhum. Aí ele viu minha mãe e levou pra ele.
Minha prima ouviu, não muito atenta, balançou a cabeça e disse “tá, agora brinca comigo?”.  
Vida seria tão mais fácil se acreditássemos em Papai Noel e morte fosse só uma palavra que nem sabemos escrever!

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Fossa: aprecie com moderação

Depois de quase 20 dias de reclusão, finalmente saí do casulo domiciliar. Só que, ao invés de uma majestosa borboleta após a metamorfose, eu saí no mais fiel estilo “eu odeio o mundo”: blusa de pijama tamanho extra large, calça leggin surrada, cabelo desgrenhado preso com um elástico de papel.
Para quem me vê sempre agitada, fazendo mil e uma atividades, correndo de bicicleta de um lado para o outro; me encontrar de pijama as 3 da tarde é algo, no mínimo, inesperado.
Minha avó quase caiu da cadeira quando me viu entrar pela porta da cozinha desse jeito.
 - Minha filha! Você está um caco! – (viva a sinceridade da terceira idade) – Hoje nós temos que ir ao salão. Você vai fazer mão, pé, cabelo, depilação, massagem... – E começou a listar um monte de tratamentos de beleza.
- Eu não tenho que ir a lugar nenhum além da minha cama.
Era muito cedo para dar um tapa no visual. Eu vi nos filmes que quando uma mulher passa pelo que eu passei, deve ficar semanas de pijama (quem sabe até meses). Faz parte do “protocolo-sua-mãe-morreu”: o mundo cria uma imagem mental de você soterrada em lencinhos de papel usados, devorando caixas de chocolate e assistindo pela milhonésima vez “Um amor para recordar”. O que pensariam de mim se me vissem toda guapetona? No mínimo que eu não estou nem aí pro fato de ter perdido a mãe.
Tentei convencer minha avó a aceitar a minha escolha de não tomar banho pelos próximos três dias, mas foi tudo em vão. É impossível lutar contra a determinação da minha avó, ela passou 73 anos aprimorando a técnica de persuadir os parentes e é mestre nisso.
Lá fui eu arrastada para o Wernner. Na minha cabeça eu imaginava as dondocas do salão me olhando torto enquanto eu andava pelo corredor principal. “O que essa mendiga está fazendo aqui?” – elas diriam. E eu ouviria as peruas cochichando sobre o meu cabelo despenteado e a minha blusa gigante.
Entrei no salão morrendo de vergonha, só esperando os olhares de desaprovação. Mas ninguém me olhou nem disse nada. Estavam todas absortas em seus I-phones, I-pods, blackberries e yogoberries light.  “Como assim ninguém está falando mal do meu look? Cadê as dondocas de nariz empinado? Não se fazem mais peruas como antigamente!”
Sentei emburrada na cadeira e esperei ser atendida. Um cabelereiro veio até mim e começou a hidratação capilar. Nunca entendi porque mulher paga uma fortuna para que outra pessoa passe shampoo na sua cabeça. Não é mais fácil a gente mesmo passar? Mas minha avó estava disposta a pagar o que fosse para me ver bem, só cabia a mim (tentar) aproveitar.
Depois de quilos de cremes, condicionadores, loções e outras frescuras, ele começou a massagear minha nuca. Aquilo estava dentro do pacote? A nuca nem é parte da cabeça! “Peraí, agora ele está massageando minhas têmporas. Isso é bom! Isso é muuuito bom! Porque não me contaram que tinha massagem também? Vovó, me traga aqui todo dia!”.
A hidratação acabou e eu já não tinha mais raiva do universo. O mundo é cor de rosa! Viva! Viva! E meu dia de beleza não acabou por aí: também fiz as unhas (rosa-pink, para combinar com o resto do mundo, claro!).

Dica do dia:
Mande os protocolos para o espaço! Quem gosta de você de verdade não vai querer te ver deprimida em casa. E se alguém pensar que você não está sofrendo só porque suas unhas estão feitas, mande essa pessoa ir catar coquinho no asfalto. O luto é necessário sim, mas tem que ser importante para você, não para os outros. Ficar mais recolhida nesses dias é super normal e necessário, mas também temos que saber a hora de sair da fossa. A grande verdade é que a vida continua. Ah! E que “Um amor para recordar” é o filme mais chato ever.



terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Experiência não se transmite, se vive.

Sabe aquele conselho de mãe que a gente escuta, mas nunca segue? Sempre fazemos tudo ao contrário do recomendado e no final percebemos que ela estava certa? Mãe tem um faro infalível. Quando diz que vai chover, chove; quando diz que vamos ficar resfriados se não colocamos o casaco, nos resfriamos; quando diz que determinado cara não presta, ele não presta mesmo.
Eu já perdi a conta das vezes que eu quebrei a cara por não ter seguido algum conselho materno. Uma vez ela sonhou que eu me envolveria com um cara dez anos mais velho chamado Bruno* e não ia dar certo. Não deu outra. Na semana seguinte eu conheci um rapaz que se encaixava perfeitamente na descrição. A curiosidade quase matou a gata aqui.
Por mais que digamos “isso nunca mais vai se repetir!” ou “a partir de agora eu seguirei todos os conselhos da minha mãe!”, nunca seguimos de fato. E isso não é um problema, é na verdade o início da solução. Caminhar por nós mesmos é o primeiro passo para o desenvolvimento de uma identidade individual. O segredo é saber dosar a nossa gana de experimentar com a voz daqueles que já passaram por isso.  E, claro, aprender com os erros.
Eu não me arrependo de ter mergulhado de cabeça em tantas roubadas, afinal, se a minha mãe sabia que seriam roubadas, era porque ela já havia mergulhado da mesma forma quando tinha a minha idade. Experiência não se aprende, se vive.
E como eu nunca fui mãe, não sei se meus conselhos desse blog serão assim tão certeiros. Mas sabe de uma coisa? Acho isso muito bom. Não quero acertar sempre nem ter que dizer “eu não te disse?”. Tenho apenas 17 anos e ainda pretendo beber, cair e levantar (glamorosíssima) muitas e muitas vezes.
Desejo que você possa se dar ao luxo de fazer tudo ao contrário do que eu sugiro aqui sem cair em roubada. Siga sua intuição, acerte, erre e construa você próprio seu caderninho de dicas de autoajuda.
Ah! E não guarde à sete chaves! Compartilhe com quem também está passando por momentos difíceis, o mundo precisa de atitudes como essa.


*Nome fictício!!! (Achou que eu ia dar esse mole?)

Autoajuda

Nunca entendi o propósito dos livros de autoajuda. Já repararam que esse nome anula finalidade da leitura? Se a ajuda deve vir de nós mesmos, por que precisamos do livro? A minha falta de compreensão do objetivo dessa literatura criou em mim uma barreira que me impede de ler qualquer coisa do gênero.
Acredito na importância da troca e, portanto, toda vez que preciso de auxílio, busco pessoas reais: amigos, parentes, profissionais... Ao conversarmos e compartilharmos pensamentos, ambas as partes do diálogo se beneficiam e crescem em conjunto. É por isso que quando eu consigo superar alguma barreira, não me presenteio com um falso troféu de “autoajuda”. Reconheço que só cheguei aonde cheguei por causa do apoio recebido de fora.
Mas, embora sejam sempre bem vindos os conselhos daqueles que torcem por nós, há determinadas trilhas que devemos traçar sozinhos. Quando minha mãe morreu de câncer, dia 24 de dezembro, percebi que, mesmo que não negasse assistência externa, o maior auxílio para viver esse momento deveria vir de mim mesma.
Cada pessoa tem sua válvula de escape. No meu caso, escrever sempre foi uma deliciosa maneira de pôr meus pensamentos em ordem. Quando minha caneta purpurinada desliza sobre o papel, é como se um novelo todo emaranhado fosse desembolando na minha cabeça; como se a luz do quarto acendesse e eu visse que aquele fantasma não passa da sombra da cortina projetada na parede.
Por isso, desde a véspera do Natal desse ano, eu registro depoimentos pessoais em um caderno só meu. E pela primeira vez a palavra “autoajuda” me pareceu perfeitamente adequada: meu objetivo principal ao escrever isso tudo é me auto ajudar a seguir em frente. Com certeza muito da minha sanidade mental se deve a esse hábito. Em quase um mês de diarista (def. do dicionário Isadora: pessoa escreve diários), aquelas anotações despretensiosas viraram uma pilha gigantesca de histórias, dicas e aprendizados.
A ideia de publica-las já me ocorreu outras vezes, mas como eu acreditava que só era possível solucionar os problemas dos outros depois de eliminar os meus, preferia esperar resolver primeiro as minhas questões, para aí tentar ajudar quem quer que fosse.
Só que nunca chegou o dia do fim total dos meus problemas; quando eu me livro de um, logo aparece outro. Diante dessa “persistência problemática” eu decidi não esperar que uma avalanche de folhas de rascunho caísse sobre a minha cabeça e resolvi unir o útil ao agradável, publicando tudo em um blog.
Aqui exponho desde pensamentos íntimos a acontecimentos corriqueiros, na esperança de poder te ajudar também a viver perto e longe daquela pessoa querida que está com câncer. Não espero que você siga à risca os meus conselhos e sim que, a partir deles, busque sua própria maneira de se auto ajudar a superar momentos difíceis.
Esse blog é seu também, portanto se sinta livre para seguir as dicas que gostar, descartar o que não julgar procedente, fazer comentários, compartilhar com quem quiser e me ajudar na tarefa diária de construí-lo.